Azeite de oliva e Brasil não é um associação exatamente óbvia. Os maiores produtores do mundo – Espanha, Itália, Grécia, Turquia, Tunísia e Portugal – tem climas bem distintos do nosso, situando-se majoritariamente ao longo do Mar Mediterrâneo. Contudo, há cerca de quinze anos, alguns fazendeiros teimosos começaram a plantar oliveiras no Rio Grande do Sul para entender se a cultura era viável: dando certo, estariam inaugurando um mercado completamente inexplorado no país, o de azeite nacional. Não foi nada simples.
Só agora, em 2018, é possível começar a ver o resultado desse empreendedorismo: o Brasil já produz azeite de oliva extravirgem. As principais áreas são o Rio Grande do Sul e a Serra da Mantiqueira (liderado por Minas Gerais), região na qual já existem mais de 100 pequenos produtores distribuídos por aproximadamente 2 mil hectares. A safra de 2017, segundo a Associação dos Olivicultores dos Contrafortes da Mantiqueira (ASSOOLIVE), rendeu 42 mil litros de azeite. No país todo foram 105 mil litros de azeite de oliva. É pouco? Pouquíssimo (para se ter uma ideia, Espanha produziu 1 milhão de toneladas), mas o importante está lá: o potencial para azeites de alta qualidade.
“O problema da olivicultura é que não é algo no qual tenhamos história. As primeiras empreitadas no país foram um fracasso. Hoje ainda temos poucos bons profissionais (engenheiros ou técnicos agrônomos) num cultivo que cresce ano a ano. É muito charmoso plantar oliveiras e fazer o próprio azeite – e como a árvore é de solo “ruim” e seco, todo mundo acha que é fácil cultivá-la”, diz Glenda Hass, Co-fundadora e Presidente da Olivoteca, instituição voltada para a educação e promoção da cultura do azeite de oliva extra virgem no Brasil. “No entanto, as características de clima e solo são diferentes das do mediterrâneo. Muitos produtores buscam a opinião de consultores de fora, que também tem pouca experiência nesta situação. Ainda tudo é muito na tentativa e erro”, completa.
Pelo que venho notando, os erros estão diminuindo rapidamente e há diversos bons rótulos no mercado: Batalha, Prosperato, Verde Louro, Olibi, Serra dos Garcias, Duidálio, Oliq, Borrielo, Verde Oliva… Sou fã e consumidora de azeite extravirgem nacional. As plantações de duas das minhas marcas favoritas – Serra dos Garcias e o Olibi – ficam em Aiuruoca, Minas Gerais. Aproveitei a safra de azeitonas, que terminou em meado de marçompara visitá-las e acompanhar da colheita ao engarrafamento.
Como é feito o azeite de oliva?
Tanto Serra dos Garcias quanto Olibi são propriedades familiares e dedicam apenas parte do terreno para as oliveiras: a consciência de que monoculturas extensivas não trazem nenhum benefício a médio/longo prazo, e são extremamente danosas ao meio ambiente, é cada vez mais essencial. Em ambos, a produção é supervisionada por um engenheiro agrônomo e pelos olhos atentos dos proprietários: a psicóloga Silvia Marques e o Nélio Weiss, respectivamente.
Por conta das áreas pequenas, a colheita é feita à mão com a ajuda de derriçadores (os mesmos usados na do café), espécie de grandes garfos vibratórios, que balançam a árvore para que os frutos se soltem e caiam numa lona branca colocada sob as oliveiras. Durante esse processo, as azeitonas são movidas para caixas de transporte e levadas imediatamente para o lagar. A rapidez neste ponto é crucial para a qualidade do produto final: quanto mais tempo se passa entra as etapas, mais o fruto oxida e fermenta com o calor do ambiente, comprometendo a qualidade. A tal ‘acidez’ do azeite depende muito deste momento da produção.
Uma vez no lagar, são lavadas e jogadas na extratora, máquina que prensa o fruto inteiro – com caroço -, extraindo o azeite e separando-o do bagaço (chamado de sansa). O azeite segue para decantação (processo que separa a água e impurezas), filtragem (para retirar qualquer resquício sólido) e engarrafamento. Parece fácil, né? Só parece.
As variáveis que impactam a qualidade
As oliveiras – que demoram cerca de quatro anos para se tornarem produtivas- precisam ser muito bem cuidadas 365 dias por ano para que frutifiquem em todo seu potencial. Se o solo está desequilibrado, se há poucas abelhas na região para a polinização, se chove demais ou de menos, se as árvores estão plantadas muito perto umas das outras e outras dezenas de “ses” comprometem o resultado do trabalho. Tudo isso dando certo, há que se escolher o ponto de maturação da azeitona para colheita: mais verdes, produz azeites frescos, herbais; mais maduras, azeites frutados. Contudo, as verdes tem menos óleo, o que significa menos rendimento (apenas 10% a 12% da azeitona ‘se transforma’ em azeite).
Não é comum uma fazenda ter apenas uma variedade de azeitona: a maioria dos grandes azeites são blends (misturas). Isso se deve ao fato de cada variedade ter características de sabor e aroma distintas – como acontece com toda fruta, seja ela maçã, banana, manga-, o que dá mais complexidade ao produto final. O Ministério da Agricultura permite o cultivo de apenas dez variedades, estando entre elas a Picual, Koroneiki, Arauco, Coratina, Ascolano, Grappolo, Maria da fé e Arbequina. É bom esclarecer que as azeitonas para azeite são bem diferentes das ‘de mesa’: bem menores e com menos polpa.
Então: se cada uma dessas etapas for cumprida, teremos um azeite extravirgem. Se alguma delas foi comprometida, e o azeite apresentar algum defeito sensorial, teremos o azeite virgem. Se tudo deu errado, esse azeite passa por um processo de refino, com uso de solventes, e teremos o azeite de oliva, vendido com pequena adição de azeite virgem ou extravirgem.
Mas a pergunta que não quer calar é: nosso azeite é bom mesmo? “Os azeites extravirgens nacionais, cultivados, extraídos e envasados no Brasil, não sofrem mistura e são confiáveis. Os produtores brasileiros estão trabalhando duro para ter um produto de qualidade”, diz Glenda.
Não coma azeitona direto do pé!
Visitas a produtores
- A Olibi (Aiuruoca/MG) oferece visitas guiadas aos os sábados, 10hs. O valor é de R$ 35/pessoa. Agendamento pelo email [email protected]
- A Oliq (São Bento do Sapucaí/SP) oferece visitas guiadas aos sábado, domingos e feriados por R$ 10/pessoa. Não é preciso agendar.
- A Verde Louro (Cangaçu, RS) oferece visitas guiadas de segunda à sábado mediante agendamento pelo [email protected]
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