Chef Vivi: o encontro do sabor e da simplicidade

De comer agradecendo: Moranga orgânica ao forno, repolho roxo orgânico tostado, figo com mel in natura e redução de laranja e especiarias

De comer agradecendo: Moranga orgânica ao forno, repolho roxo orgânico tostado, figo com mel in natura e redução de laranja e especiarias

Outro dia, numa conversa sobre frutas orgânicas e convencionais, ouvi de uma jornalista: “Não ligo para agrotóxico, não tem gosto”. Dizer que fiquei pasma não chega nem perto da minha real reação. Esse pensamento obtuso, vindo de alguém que supostamente passa informação a terceiros, me acendeu o alerta vermelho-sangue-de-boi: perdeu-se completamente a noção do que é comida boa. Do que é comida, enfim.

O modo atual de produção e consumo de alimentos  – seja alface ou hambúrguer – está levando o mundo à exaustão, matando o solo, exaurindo até a última gota os recursos hídricos; contaminando riachos, mares, plantas, peixes, gente; aumentando drasticamente o números de obesos, diabéticos, cardiopatas. Basta estar disposto a aceitar as evidências presentes em milhares de reportagens e em documentários como Food Inc., Cowspiracy, Food Matters, The Price of Sugar, entre outros. Não há como negar.
Couvert do Chef Vivi: pães artesanais quentinhos, bom azeite, flor de sal e manteiga

Couvert do Chef Vivi: pães artesanais quentinhos, bom azeite, flor de sal e manteiga

Por isso o termo ‘sustentabilidade’ está aparecendo cada vez mais nos discursos de pessoas ligadas à gastronomia e alimentação  – e a tendência é que se torne inerente deste discurso, porque não há outra maneira, já a curto prazo, de continuarmos existindo sem sofrer graves consequências. Ser sustentável significa focar numa nova maneira de produzir e alimentar-se bem, com prazer, sem destruir a nós mesmos nem ao lugar em que vivemos (lugar que são todos; o planeta).

Por isso meu susto com o comentário da colega de profissão: antes de ser ignorância pontual sobre o tema, é uma ignorância orgulhosa, o que de mais daninho pode haver sob o sol.

Pescado do dia ao forno com caldo de cabeça de peixe e abóbora, arroz negro com alho poró e pimenta dedo de moça

Pescado do dia ao forno com caldo de cabeça de peixe e abóbora, arroz negro com alho poró e pimenta dedo de moça

Neste movimento de trazer consciência sobre o que se come, da onde vem o que se come, como foi criado o que se come, os chefs são fundamentais. São os cozinheiros, ao optarem por usar ingredientes limpos e de qualidade, que dão o poder a pequenos produtores para abandonar os métodos convencionais recheados de química nociva e voltarem-se à práticas mais sustentáveis. Suas escolhas impactam diretamente o campo.

São cozinheiros que exigem alimentos limpos, bons, saudáveis e sazonais que lideram o movimento que se tornará, em breve, uma gritante voz mundial: a maneira que comemos determina como o planeta é usado (sobre isso, leia o excelente novo livro de Dan Barber, lançado pela editora Rocco, “O Terceiro Prato“). São cozinheiros como – citando apenas alguns –  Ivan Ralston, Lis Cereja, Lisandro Lauretti, Paola Carosella, Neka Mena Barreto e Viviane Gonçalves, do chef Vivi, tema deste post.

Filé mignon de Waguy finalizado no forno e acompanhado por couscous com amêndoas e legumes do Chef Vivi

Filé mignon de Waguy finalizado no forno e acompanhado por couscous com amêndoas e legumes do Chef Vivi

Casa aberta há quatro anos, na Vila Madalena, o Chef Vivi sempre apostou na sazonalidade dos ingredientes da maneira mais extrema: o cardápio muda todos os dias. Na composição dos pratos, o máximo possível de orgânicos, muitos vegetais servidos em seu maior vigor e sabor e porções de proteína animal de tamanho sensato. No salão, presença quase zero de foodies, intagramers à procura de likes e congêneres – o Chef Vivi não é nem quer ser ‘cool’ ou ‘da moda’. Ela quer servir comida deliciosa, simples, viva. E consegue.

São cerca de 10 opções diárias com menu a R$ 79,50 (entrada e principal). Há a possibilidade de pedir pratos isolados, mas o set menu, financeiramente, vale muito mais a pena.

Bolo quente de tâmaras com açúcar mascavo e calda de caramelo (R$ 18)

Bolo quente de tâmaras com açúcar mascavo e calda de caramelo (R$ 18)

Você pode encontrar creme de abóbora japonesa, iogurte natural orgânico, raspas de limão siciliano e brotos (R$ 38), delicadíssimo Linguini de grano duro, cogumelos salteados, flor de nirá, lascas de grana padano e broto de girassol (R$ 42), suculenta Moranga orgânica ao forno, repolho roxo orgânico tostado, figo com mel in natura e redução de laranja e especiarias (R$ 44), Pescado do dia ao forno com caldo de cabeça de peixe e abóbora, arroz negro com alho poró e pimenta dedo de moça (R$ 68,50), Filé mignon de Wagyu finalizado no forno e acompanhado por couscous com amêndoas e legumes (R$ 76) ou Polenta ao forno crocante, fios de palmito pupunha, molho de grana padano, sálvia tostada e folhas de mizuna (R$ 53). Ou nenhum deles – tudo depende do que estiver na estação.

Que sobremesa! Torta de chocolate belga 70%, castanha do pará quebrada, farofa crocante e creme inglês com fava de baunilha (R$ 25)

Que sobremesa! Torta de chocolate belga 70%, castanha do pará quebrada, farofa crocante e creme inglês com fava de baunilha (R$ 25)

Toda vez que como ali saio me perguntando por que ainda é uma minoria dos chefs famosos – por talento, por presença na mídia, ou ambos – que foca esforços no primeiro front da boa alimentação, do que eu considero verdadeiramente ‘gourmet’: a qualidade e saúde do ingrediente. 

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