Sujeirinha boa

A vida tem que ser razoavelmente suja para ser gostosa. Em todos os sentidos.
Com comida, por exemplo. Se eu topar com um chef imaculadamente limpo, de touca, luva, avental, sobrancelha aparada e antisséptico bucal, saio correndo e vou bater um rango no boteco: paramentado assim, ele só pode estar preparando uma bomba com a qual não quer ter nenhum contato. Sou muito mais a vovozinha da cantina de bairro que enrola os nhoques com as mãos – saborear a nostalgia de um prato preparado na hora, com carinho, algumas vezes vale mais do que estrelas no Guia Michelin. Além disso, nunca conheci alguém que tenha morrido por contágio letal transmitido por um pastel de feira ou uma pizza de padaria.
Em casa também não dá para ser neurótico. Sou do tipo que não larga o rodo. Odeio chão melequento. Mas sou desencanada na difícil relação bichos X limpeza total. Animais também precisam ser ligeiramente porquinhos para serem saudáveis e fofos. Tenho sete gatos e raramente dou banho neles – felinos são autolimpantes. Mas quando meus persas mudam de cor por conta da fuligem paulistana, mando-os para o pet shop com uma recomendação piscando em néon pink: “jamais passar perfume”. Se eu quisesse um ser macio e com cheiro de loja de cosmético popular, comprava um ursinho de pelúcia e besuntava alfazema.
Pode não ser chique, mas um gato se rolando na grama molhada e uma bela enfiada de dedo na cobertura do bolo fazem o dia bem mais feliz.

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